Bikepacking de Florianópolis a Urubici

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Deuses astronautas

Como se sabe bem, se subiu tem que descer e lá fomos nós para uma entrada triunfal e anônima em Anitápolis, quase ninguém na rua para nos receber e dar vivas pelo objetivo cumprido do dia. Nas ruas calçadas com pedras hexagonais, simpáticos e atenciosos cidadãos nos informaram da padaria e da farmácia, passamos por uma blitz, testemunhamos um cara embriagado ser hospitalizado. Fiquei pensando, cada um faz o que pode para tentar se aliviar da pressão, do peso e da gravidade de uma vida onde se é ensinado a ser melhor do que o outro. Reunimos as informações necessárias para encontrar um lugar com camping grátis para passar a noite. A chuva nos acompanhou de longe durante a parte final deste primeiro dia. Após comprar o que faltava para o acampamento, quando pedalávamos para a Usina Hidrelétrica, ela veio com força. Na Usina fomos recebidos gentilmente pelo pessoal que cuida do bar dali. O local foi reformado e ficou bem legal. Pedimos pra armar as barracas, a resposta foi positiva e logo uma travessa de batatas-fritas apareceu para matar o que nos matava, pedido do Daniel. Nos ofereceram a cobertura onde estávamos, mas teríamos de esperar até que o bar fechasse e poderia demorar. O cansaço e a possibilidade de ficar mais isolado e em silêncio nos fez recusar a oferta.

Acampamento na usina

Depois de um banho no rio, fomos montar as barracas. O Giovani armou a barraca no lado esquerdo do bar, bem ao lado do rio. Eu e o Daniel ficamos mais abaixo, ao lado da cachoeira, numas mesas com churrasqueira. Eu estava usando uma barraca nova, mas o isolante inflável era bastante usado e remendado. Furou muitas vezes enquanto eu tentava dormir, furava e eu remendava, até que desisti e fiquei ali acordado em cima daquele chão úmido. Coloquei o saco de dormir embaixo e dormi dentro do liner, nada mal até aí. O barulho da água, o chão duro e úmido, a luz dos refletores ligados por toda a noite não contribuíram em nada para o meu sono, que nessa noite foi pra outro lugar. O domingo amanheceu devagar e sem chuva. Lentamente também nos pusemos de pé e iniciamos o recolhimento, a organização e a compactação dos equipamentos nas bolsas das bicicletas. Não preparamos o café ali, porque decidimos tomar um cafezão na padaria do centro, ao lado da praça, que segundo informações do proprietário estaria aberta. Nada de vida na padaria, mas um mercado estava aberto e para lá fomos. Antes procuramos pelo bar indicado por um trilheiro, sem sucesso. Bananas, bolachas, coca e achocolatado nos trouxeram de volta à vida.

Partimos de Anitápolis para os 23 km sem subidas até Santa Rosa de Lima, com 108 km percorridos até agora. Caminho novo para mim com a bicicleta, já tinha feito esta parte de moto anos antes, mas não lembrava de muita coisa. Estava bastante animado apesar das pernas moles, já tinha tentado duas vezes antes fazer este trajeto e não consegui, por vários motivos. O caminho subiu levemente e desceu bastante até Santa Rosa. Quando chegamos viramos o guidão para o lugar que melhor recebe os viajantes sedentos. Lugar onde o sorriso é abundante, onde todo tipo de informação pode ser conseguido e também o único aberto na cidade, o bar. Estou convencido, as cidades não precisam de emissoras de rádio, TV ou jornais, precisam de bares. Bastou chegar e pedir uma cerveja, no meu caso um refrigerante e salgadinhos, responder as perguntas de onde vínhamos e fomos tratados como deuses astronautas. Passado o primeiro contato e o choque, um veterano dono do bar nos indicou o melhor caminho para Aiurê para ir de bicicleta. Ele disse, Rio dos Índios, Rio dos Bugres, Rio Chapéu e Capoeirão. Como se pode imaginar, houve muita conversa cruzada, muitos veteranos falando alto, nos dando dicas e mais dicas de atalhos e caminhos a evitar e a seguir, entre uma bebericada no limãozinho e uma tragada. Informações precisas sobre as distâncias, tipo, daqui até ali, moço, de bicicleta vai dar uns 30 km.

4 Responses

  1. Fernando Morado

    Belo relato, você tem talento para escrever. Comecei no pedal e fiz, em junho, Santana do Riacho/Diamantina e em seguida Diamantina/Ouro Preto (Estrada Real, Caminho dos Diamantes). 650 km de muita subida, cascalho, sozinho e aos 59 anos. Faltam os trechos de Ouro Preto a Paraty (Caminho Velho) e Ouro Preto a Petrópolis (Caminho Novo), que devo percorrer no final de agosto. Após, pretendo encarar estas belezas da sua região, que já conheci de carro há bastante tempo.
    Abraços,
    Fernando Morado
    @moradopenna

    • aresta

      Oi Fernando, bom dia. Que bom que tu gostou do texto, escreva sua história também. Quando vier para pedalar por aqui avisa antes que se for possível vamos juntos ou te dou umas dicas dos lugares que já fui. Abraço luciano

  2. Fernando

    Olá Luciano, realizei o trecho da Estrada Real Ouro Preto/Paraty, +/- 700 km, também sozinho. Agora estou planejando ir para o sul. Vamos ver. Abs.

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